quinta-feira, março 13, 2025

Um "supremo" legislador e julgador

 Faltou aos constituintes de 1988 uma bola de cristal.

Se fossem dotados dessa capacidade de ver o futuro deste nosso Brasil, poderiam ter evitado o que, nos últimos anos, vem aqui ocorrendo na transformação do Supremo Tribunal Federal em um ente jurídico híbrido. Uma mescla de jus-legislativo. Um judiciário legislador.

Onde ficou a tripartição de poderes da República? Os ossos de Montesquieu devem estar rolando na sua tumba.

Considero uma contradição o denominado "foro privilegiado" ou foro por prerrogativa de função instaurado diretamente no Supremo Tribunal Federal, a que se refere o artigo 29, X, da vigente Constituição Federal.

Como pode alguém que seja processado diretamente no âmbito do Supremo Tribunal Federal ver nisso um privilégio?

Ora, o foro "privilegiado" é uma excrescência jurídica. É a negação do direito a julgamento pelo denominado juiz natural, o juiz da primeira instância judiciária, no foro competente. Limita o direito à ampla defesa e ao contraditório. E, o que é pior: sendo o STF instância inicial e final, a vítima desse foro "privilegiado" não tem a quem recorrer no caso de sua eventual condenação.

Garante a Constituição que todos são iguais perante a lei. Sendo assim, não se pode negar a ninguém a proteção dos direitos fundamentais. E, no caso do foro "privilegiado" se evidencia a ausência dessa proteção, podendo se concluir que, aí, os únicos privilegiados são os ministros do Supremo Trbunal Federal. Privilegiados ao menos porque encontram aí uma forma indireta de evitar processos de impeachment contra suas pessoas. Basta que tenham entre os processos ali instaurados algum réu que ocupe cargo legislativo no Congresso Nacional.    

Mas há um remédio para a efetiva garantia de todos, bastando emenda à Consttuição. Já recomedei isso a alguns deputados e senadores.

Basta estabelecer que o "foro privilegiado" seja deslocado e tirado da competência jurisdicional do Supremo Tribunal Federal. Passaria à competência da Justiça Federal de Primeira Instância da Capital Federal. Com direito ao contraditório, à ampla defesa, ao devido processo legal. Como também o de apelação de suas sentenças à segunda instância judiciária, e, daí ao Superior Tribunal de Justiça, de cujas decisões ainda poderia caber a interposição de recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal.

Essas minhas considerações e recomendações tomam ênfase, quando, agora, o Plenário do STF acaba de alargar o "foro privilegiado" para poder processar também quem já tenha deixado de exercer cargo ou função pública ou eletiva. 

A supremacia é do povo, que tem na Constituição a garantia dos seus direitos fundamentais.

segunda-feira, março 10, 2025

Quem deve ser indenizado na questão fundiária?

Volto ao tema da polêmica envolvendo a demarcação de terras indígenas.

Essa demarcação passou, expressamente, a ser dever da União Federal de 1988 (artigo 231).

Ficou a cargo da  Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

É preciso considerar alguns fatores inerentes à ocupação das terras ao longo da história do Brasil.

Nem todo o território do que veio a ser o Brasil era ocupado por povos ditos originais, também denominados de indígenas.

Pode-se afirmar  que ocupavam apenas partes desse território.

E a ocupação de determinadas áreas chegou a ser abandonada por motivos diversos, deslocando-se sua população para outras regiões desse território. Cessou, assim, ali essa ocupação tradicional.

Em consequência essas áreas assim desocupadas ficaram livres para ocupação por terceiros (outros indígenas ou não-indígenas).

A história brasileira nos mostra que áreas tradicionalmente ocupadas por tribos indígenas acabaram sendo conquistadas por invasores. Os colonizadores portugueses e outros imigrantes europeus, principalmente..

Surgiram, assim, os primeiros povoados, com suas áreas rurais e urbanas, resultando no que hoje são os inúmeros municípios brasileiros.

Assim, o marco temporal para a demarcação das terras indígenas nem precisa ser o da promulgação da Constituição de 1988. Pois já ocorreu muitos anos antes dessa data, na consolidação da ocupação do território brasileiro por nossos antepassados estrangeiros e seus descendentes.

Logo, essa omissão da União ao deixar de promover a demarcação de terras indígenas tem dois efeitos práticos:

1) o dever de a União Federal indenizar os indigenas (financeiramente ou com novas terras públicas) pelas perdas territoriais sofridas; e,

2) o dever de preservar o direito dos não-indígenas de continuar ocupando essas antigas terras indígenas. 

Nunca o inverso, sob pena até mesmo de uma convulsão social e de perdas econômicas e sociais inestimáveis para a nação brasileira.

 

 

    é231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

domingo, março 09, 2025

Ainda estou aqui!

Como advogado e cidadão brasileiro, sou e sempre fui avesso a qualquer ditadura. Militar ou não. 

Vivemos hoje no nosso Brasil não sob uma ditadura militar, mas sob um regime togado ditatorial. Sem direito ao juiz natural, ao contraditório, a recursos, à ampla defesa e ao devido processo legal.

Uma ditadura não é boa para ninguém, a não ser para o ditador e seus lacaios. 

Todas as suas vítimas merecem o mesmo reparo.

Não se lhes pode ser negada essa reparação sob o argumento de que não compartilhem dos mesmos princípios, ideias ou ideais de outros que possam ter sofrido os efeitos dos desmandos autoritários.

O Estado Democrático de Direito se sustenta na  defesa de nossos direitos fundamentais e não na vontade de qualquer ofensor desses direitos. 

É irrelevante se o ditador veste uma farda ou uma toga. 

Relevante é o fato de que a ditadura seja repelida e que sobrevenha a condenação do ditador e seus comparsas. 

Só assim poderemos proclamar o "Ainda estou aqui". Como um grito em defesa da liberdade.