domingo, maio 26, 2019

TRF1 profere decisão equivocada sobre compensação tributária


Decisão equivocada (comentada ao seu final)

TRF1 decide que  compensação tributária somente pode ser autorizada com créditos do sujeito passivo

Conforme publicação de 23 de maio deste ano de 2019, a 7ª Turma do TRF1 negou provimento à apelação de uma empresa de assessoria tributária contra a sentença, da 6ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais, que considerou que a legislação tributária veda a compensação com créditos de terceiros oriundos de decisões judiciais não transitadas em julgado pelo contribuinte cessionário.

Segundo os impetrantes, o direito de compensação foi autorizado judicialmente por meio de decisão cautelar, afastando a exigência do trânsito em julgado como requisito para a compensação.

Consta dos autos que os requerentes formularam administrativamente pedido de compensação tributária com base em créditos discutidos judicialmente em sede de medida cautelar, na primeira instância, confirmada pelo TRF 5ª Região, que favorecia a parte impetrante ao reconhecer o seu direito ao creditamento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

A Fazenda Nacional (FN) interpôs recurso especial e extraordinário em face da decisão que permitia a efetivação de compensações tributárias antes mesmo do trânsito em julgado; o órgão colegiado, por sua vez, recebeu os recursos com efeito suspensivo, impedindo-se a exigibilidade dos créditos tributários.

O relator, juiz federal convocado Marcel Peres de Oliveira, destacou que após a edição da Lei nº 11.051/2004, que alterou o art. 74 da Lei nº 9.430/96, ficou estabelecido no § 12 que será considerada não declarada a compensação nas hipóteses em que o crédito seja de terceiros.

De acordo com o magistrado, a norma referenciada está em consonância com o art. 170 do Código Tributário Nacional (CTN) que, no seu caput, previu que a compensação somente pode ser autorizada com créditos do sujeito passivo.

Foi unânime a decisão ocorrida nesse processo, sob o nº: 0033011-57.2007.401.3800/MG

Fonte: Tribunal Regional Federal da 1ª Região


COMENTÁRIOS DE PRADO GARCIA ADVOGADOS, POR SEU SÓCIO-FUNDADOR, DR. PLÍNIO GUSTAVO PRADO GARCIA

Essa decisão só é correta num ponto: ainda não havia o reconhecimento da cessão e transferência do crédito tributário por decisão judicial final (trânsito em julgado). Aplicável aí o disposto no artigo  Art. 170-A do CTN: “ É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)” 

Apenas nesse sentido se poderia impedir a efetivação dessa cessão e transferência de crédito para fins de compensação tributária pelo cessionário no lugar do cedente.

No mais, os fundamentos jurídicos dessa decisão estão equivocados.

Nesse sentido, não há como aceitar o entendimento do relator, juiz federal convocado Marcel Peres de Oliveira, segundo o qual após a edição da Lei nº 11.051/2004, que alterou o art. 74 da Lei nº 9.430/96, ficou estabelecido no § 12 que será considerada não declarada a compensação nas hipóteses em que o crédito seja de terceiros.

O instituto da cessão e transferência de créditos é instituto de Direito Civil,  respeitado pelo artigo 110 do Código Tributário Nacional. Assim, o crédito objeto de cessão de seu titular a um terceiro deixa de ser crédito daquele titular para seu sucessor, que, portanto, não mais será um terceiro perante o devedor. Crédito financeiro, como é a natureza do crédito tributário, é passível de cessão e transferência como qualquer outro crédito sob as normas do Código Civil.

Ofendendo o artigo 110 do CTN sobressai a ilegalidade da alteração do artigo 74 da Lei 9.430/96, pela Lei 11.051/2004, no seu parágrafo 12. Em outras palavras, continua o credor da Fazenda Pública com o direito de ceder e transferir a terceiros seu crédito tributário para fins de aproveitamento desse crédito pelo cessionário no pagamento de débitos tributários próprios junto à mesma Fazenda Pública, por meio do instituto jurídico da compensação de créditos entre credores e devedores recíprocos.

Como a cessão e a transferência de direitos creditórios se coadunam com a livre disposição de elemento integrante do patrimônio individual, esse instituto jurídico se insere no âmbito do direito de propriedade e da livre disposição do que a cada um pertença. Tem, portanto, sustentáculo constitucional.


Nesse sentido, o artigo 170 do Código Tributário Nacional, mencionado na decisão ora sob comentário, não tem força para impedir a cessão e transferência de créditos tributários do cedente ao cessionário para que este venha a requerer  a compensação tributária no pagamento de tributos que, por ele, cessionário, seriam ou sejam devidos ao ente tributante.

Por último, ao contrário do que sustenta o juiz federal relator, não cabe neste caso a invocação do art. 123 do CTN, que nega validade aos negócios jurídicos entre particulares para fins de produção de efeitos sobre a responsabilidade pelo pagamento de tributos.

Esse artigo não se aplica, pois não se trata aqui de responsabilidade pelo pagamento de tributos, mas se débito da Fazenda Pública diante de um seu credor, cujo  direito de cessão e transferência desse crédito a terceiros se inclui no âmbito de sua exclusiva decisão. Quem tem direitos, não pode deles ser privado por ato de quem a ele seja devedor.

Lembre-se, por último, que a cessão e transferência de créditos entre credores e devedores perante a Fazenda Pública é direito constitucionalmente reconhecido inclusive para fins de operações relacionadas com o pagamento de precatórios judiciais