Habeas corpus contra o abuso de autoridade do STF
Como se sabe, o habeas corpus é garantido como meio constitucional de defesa da cidadania contra atos arbitrários da autoridade pública violadores do direito de ir e vir.
É um direto supralegal objetivando garantir a liberdade individual do paciente.
Pode ser impetrado por qualquer pessoa, que nem mesmo precisa ser advogado. E mesmo pelo paciente em seu próprio nome, esteja ele prestes a sofrer ilegal ameaça de restrição ao seu direito de ir e vir, ou quando já submetido a prisão ilegal.
Para a impetração, basta que seja escrita e assinada pelo paciente ou por terceiro no seu interesse relatando o fato que a justifique, apontando a autoridade impetrada e o pedido de expedição da ordem anulando o ato ilegal ou impedindo sua consumação.
Essa garantia da cidadania se constata no inciso LXVIII do artigo 5o. da Constituição Federal de 1988.
Uma pergunta: A Constituição exclui alguma autoridade judiciária ou não judiciária como se lhe garantisse imunidade de jurisdição para não figurar no polo passivo de um habeas corpus?
Minha resposta é um categórico não!
É certo que onde caiba recurso de uma decisão judicial, a princípio não caberia a impetração da ordem de habeas corpus. Mas isso é apenas meia verdade. Meia verdade porque o recurso pode não ter efeito suspensivo ativo imediato.
Outra questão se apresenta nos inquéritos instaurados diretamente por ministro do Supremo Tribunal Federal que evidenciem abuso de direito e de poder contra qualquer pessoa.
Quanto a isso, o STF já emitiu posicionamente sob a Súmula 606 do seguinte teor:"Não cabe habeas corpus originário para o Tribunal Pleno de decisão de Turma ou do Plenário, proferida em habeas corpus ou no respectivo recurso."
Até aí não teria problema se o paciente não estivesse sofrendo ameaça à sua liberdade nem estivesse submetido a pena restritiva do sagrado direito de ir e vir.
Mas essa Súmula não pode ter seu alcance ampliado nem mesmo por analogia para erguer um biombo protetor do ministro que seria a autoridade impetrada ou coatora contra o paciente, vítima desse ato vedado pela Constituição.
Como essa autoridade, individualmente considerada, não se confunde com sua Turma nem com o Plenário da Corte, a analogia aí se torna inaplicável.
Portanto, não existindo impedimento constitucional à impetração de habeas corpus originário contra ato de ministro do STF, da decisão de inadmissão do "writ" pelo relator da respectiva Turma, o recurso aí cabível haverá de ser, forçosamente, o do agravo interno à respectiva Turma judicante, assegurado pelo artigo 1.021 do vigente Código de Processo Civil. Cabendo de sua decisão contrária ao agravante recurso de agravo regimental ao Plenário dessa Corte.
Mas, ainda assim, esses HCs continuam sendo obstados pela aplicação analógica da Súmula 606/STF.
O advogado que este artigo escreve já teve a oportunidade de impetrar diretamente diversos HCs no Supremo Tribunal Federal contra atos do ministro Alexandre de Moraes, decorrentes do famigerado "Inquérito do Fim do Mundo", instaurado diretamente no STF contra as vítimas desse abuso judicial.
Como nos casos de outros tantos impetrantes, o mérito desses HCs jamais chegou a ser julgado. Foram indeferidos sob o argumento de que não cabe habeas corpus contra ato de ministro da Corte.
Ora, se nenhum recurso cabível tiver força de suspender o ato arbitrário de qualquer ministro do STF, ofensivo ao direito de ir e vir do investigado ou denunciado diretamente nessa Suprema Corte, tem-se, por consequência o cabimento de habeas corpus.
Recomendação
Assim, para superar essa inconstitucional barreira ao cabimento de habeas corpus em favor desses pacientes no STF, basta uma medida a cargo do Congresso Nacional: Uma emenda à Constituição Federal dispondo que nenhum ministro do STF terá imunidade de jurisdição, respondendo como autoridade impetrada ou coatora em habeas corpus impetrado diretamente contra sua pessoa.
Note-se, por último, que o abuso de autoridade submete o agente às penas da Lei 13.869/2019.