Infalibilidade do sistema do voto digital?
A ciência do direito se fundamenta em princípios gerais, nos costumes e nas leis que a regem.
Diferentemente da teologia, não aceita dogmas.
Assim, no campo teológico, dogma é o ponto fundamental de uma doutrina religiosa, apresentado como certo e indiscutível. Como o dogma da santíssima trindade.
Entre os princípios de direito, se destaca o da verdade material. A veracidade do verdadeiro. Todavia, esse (como outros princípios de direito), admite prova em contrário. Se assim não fosse, teríamos um dogma jurídico. O que um seria absurdo em si mesmo.
No âmbito da ciência do direito, temos a presunção da verdade, por não ser possível sua prevalência diante de provas em contrário.
Isso nos leva a uma análise do sistema eleitoral brasileiro do voto digital.
Nesse particular, constatamos a visão de ministros do STF integrantes do Tribunal Superior Eleitoral, que não admitem discussão alguma que ponha em dúvida esse sistema de voto digital.
Seu posicionamento, nesse particular, traz para o direito eleitoral o dogma da infalibilidade.
Máquinas eletrônicas de votação não podem ser equiparadas a urnas eletrônicas.
No direito eleitoral, urna é o receptáculo para recolher os votos dos eleitores, permitindo-se, assim, sua apuração.
Apuração, do verbo apurar, significa a possibilidade de contagem dos votos nelas depositados.
O sistema do voto digital não permite sua apuração. Não há como contar cada voto ali digitado. Limita-se à totalização, à somatória dos votos digitados em cada máquina de votação.
A garantia constitucional do sigilo do voto termina assim que votamos. Nesse sentido, ninguém pode ser obrigado a informar a favor de quem tenha depositado seu voto.
Mas e por outro lado, a apuração dos votos, como ato administrativo, deve respeitar o princípio e a garantia constitucionais da publicidade. Desse modo, sua contagem deve ser pública.
No sistema do voto digital não há como realizar-se a apuração, a contagem de cada voto. Isso porque impulsos elétricos ou eletrônicos não são passíveis de contagem. Apenas de totalização.
Assim, não há meio possível de apurar e contar publicamente esses votos digitais.
Exatamente por isso, desde a implantação desse sistema eleitoral no País, a veracidade das totalizações tem sido calcada no dogma da infalibilidade.
Como a ciência do direito não aceita dogmas, devendo prevalecer a contagem pública dos votos, chegamos à inexorável conclusão de que todos os candidatos eleitos desde a implantação do voto digital no País o foram ao arrepio da exigência da apuração pública desses mesmos votos.
Evidentemente, o que passou desde então não poderá ser alterado.
Em suma, os ministros do Supremo integrantes também do TSE ofendem a Constituição ao darem ao sistema vigente de voto digital o caráter de dogma, de verdade absoluta, dotado de infalibilidade.
Assim, para sanar esse vício, basta acoplar ao voto digital o comprovante físico de cada voto. Esse voto seria automaticamente depositado na respectiva urna, depois de confirmado pelo respectivo eleitor. Não levaria consigo cédula alguma. Nada haverá de errado se os votos totalizados corresponderem ao total de seu comprovante depositado automaticamente em cada urna eleitoral. Na divergência, estes prevalecerão sobre os votos digitais.