quinta-feira, março 21, 2024

Uberização - Governo Lula interfere na livre iniciativa com o inconstitucional PLP 12/2024

O governo Lula acaba de enviar ao Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar (PLP de número 12/2024), que dispõe sobre “a relação de trabalho intermediado por empresas operadoras de aplicativos de transporte remunerado privado individual de passageiros em veículos automotores de quatro rodas e estabelece mecanismos de inclusão previdenciária e outros direitos para melhoria das condições de trabalho.”

 Evidencia-se aí manifesta inconstitucionalidade e ilegalidade nesse PLP, como passaremos a  demonstrar.

Não mais estamos na primeira metade do século passado, sob o regime fascista de Benito Mussoline com sua “Carta del Lavoro”, inspiradora da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) da ditadura Vargas.

Os tempos mudaram. E a tecnologia abriu novos campos para o exercício da livre iniciativa sem submissão ao Estado centralizador e impositor.

O transporte de passageiros deixou de ficar limitado a taxis, passando a ser viabilizado pelo novo meio tecnológico de aproximação entre duas partes interessadas, o condutor autônomo e seu passageiro. O ponto comum entre eles se encontra no meio que lhes permite fazer contato um com o outro: o aplicativo de internet.

É preciso distinguir a relação jurídica entre essas três partes nessas negociações: a relação do condutor e do passageiro entre si, da relação que cada um, isoladamente, mantem com a empresa titular do aplicativo.

A relação jurídica entre o condutor e o passageiro entre si é, manifestamente, uma relação de natureza tipicamente de contrato civil de prestação de serviço de transporte de passageiro a título oneroso.

Por sua vez, as empresas de aplicativos não passam de prestadora de serviços de intermediação, conectando o condutor e seu passageiro, um com o outro. Portanto, estes são clientes delas. Nunca o contrário.

Essas plataformas têm o legítimo direito de estabelecer as regras do seu contrato (contrato de adesão), para admitir ou não os interessados na condição de condutores autônomos de transporte de passageiros. Têm pleno direito de não aceitar qualquer interessado que não preencha os requisitos dessa sua intermediação. De establecer os preços dessa sua intermediação.

Evidencia-se que esses trabalhadores autônomos não têm vínculo de subordinação a essas plataformas. Subordinação só existente com seus próprios empregados sob o regime da CLT.

O PLP do governo Lula se demonstra inconstitucional e ilegal por dois motivos: ofende a garantia constitucional da livre iniciativa (artigo 1º, inciso IV, e artigo 170 caput, da Constituição Federal); nega vigência à Lei da Liberdade Econômica do governo Bolsonaro (Lei 13.864 de 20 de setembro de 2019).

Ora, a livre iniciativa se materializa, no caso, pela liberdade de contratar entre partes capazes e legítimas.  De objeto lícito. 

As empresas de aplicativos têm o pleno direito de ofertar e prestar seus serviços de intercomunicação a quem venham elas a aprovar nos termos do seu contrato de adesão. Não são tomadoras, mas, sim, prestadoras desses serviços.

O condutores que aceitem seus termos nos contratos de adesão mantêm a plena liberdade de trabalhador autônomo. Recebem seus pagamentos de seus passageiros não diretamente destes, mas por intermédio da empresa de aplicativo. Estas, cobrando por seus seviços de intermediação, deduzem seu preço do quanto recebido de cada passageiro, passando o saldo à conta do condutor. 

Nada há de inconstitucional nem de ilegal nessa livre contratação. Mas ilegalidade e inconstitucionalidade se verifica nesse PLP – entre outros pontos – ao exigir:

a) recolhimento de contribuição ao INSS pelas empresas sobre o valor que transfiram aos condutores (20%);

b) recolhimento ao INSS de contribuição pelos condutores (de 7,5%) sobre a remuneração a eles repassada pelo aplicativo;

c) auxílio maternidade às mulheres motoristas de aplicativos;

d) limitação à jornada de prestação do serviço autônomo (qualificada como de “trabalho”), e

e) sujeição a sindicato da categoria.

Contribuição ao INSS pelas empresas e condutores - Descabimento

Ora, as empresas de app não são empregadoras dos condutores autônomos. Nem estes são empregados diretos ou indiretos dessas empresas de aplicativos. Logo, não se pode exigir que arquem estas com qualquer percentual a título de contribuição ao INSS sobre qualquer valor transferível aos condutores. Autônomos que são.

Por sua vez, os condutores autônomos talvez já sejam contribuintes do INSS por outras fontes de rendimento. E, de qualquer modo, podem fazê-lo como contribuinte não assalariado. Contribuinte voluntário.

Sobre o auxílio maternidade

Inexistindo vínculo empregatício entre a empresa de aplicativo e o condutor autônomo de veículo de passageiros, não faz sentido garantir auxílio maternidade às mulheres motoristas. Quem o custeará? E a que preço?

Descabimento de indenização

Não faz sentido também impor-se às empresas de aplicativos obrigação de pagar “indenização” aos seus clientes, os condutores autônomos de veículos de passageiros. Como pretende o PLP, ao prever que, para cada hora trabalhada, o profissional receba R$24,07/hora para pagamento de custos com celular, combustível, manutenção do veículo, seguro, impostos e outras despesas. Correto seria assegurar aos condutores autônomos o direito de excluir da base tributável dos seus rendimentos um percentual suficiente para cobrir esses custos inerentes ao desempenho do seu labor. Noutras palavras, valores dedutíveis dos seus rendimentos. Como ocorre sob o regime tributário do lucro presumido. 

Ademais, essa “indenização” elevará o preço de cada viagem para o passageiro e mesmo em prejuízo do motorista, que sofrerá a concorrência dos profissionais taxistas.

A jornada de trabalho

Outra incongruência sobressai também na imposição de jornada de trabalho a esse profissional autônomo. Que o PLP estabelece em oito horas diárias, podendo chegar ao máximo de 12, para uma mesma plataforma. Ora, o condutor tem o pleno direito, como autônomo, de trabalhar ou não trabalhar a qualquer dia, de decidir sobre o número de horas a cada dia, e se em período diurno ou noturno. E mais, se o fará por meio de uma só empresa de aplicativo ou por adesão a mais de uma delas. Principalmente porque nenhum desses contratos de adesão impõe exclusividade do condutor a qualquer delas. Nula de pleno direito seria tal cláusula se o impusesse.

 Autônomo é trabalhador mas não empregado

Trabalhador é quem trabalha. Mesmo porque inexiste um estado permanente de ociosidade para ninguém em plena saúde física ou mental. Trabalhador tanto é o assalariado como o profissional independente de patrão. Têm nos clientes seus patrocinadores. 

Os condutores autônomos são clientes das prestadoras de serviços de intermediação (plataformas de internet). Não são delas empregados. Por essa intermediação as plataformas cobram o preço dos seus serviços aos condutores. E isso é feito abatendo seu valor do quanto seja recebido de cada passageiro atendido pelo condutor.

PLP inconstitucional e ilegal

Em suma, esse PLP é manifestamente inconstitucional e ilegal. É intervencionista.  Totalmente desnecessário e prejudicial aos direitos e interesses das plataformas de aplicativos, dos condutores autônomos e dos seus passageiros, ou seja, do público em geral. Não merece aprovação nem conversão em lei.


(Este artigo foi enviado à deputada federal Caroline De Toni, presidente da CCJ em Brasília)