Decisão equivocada (comentada ao seu final)
TRF1 decide que compensação
tributária somente pode ser autorizada com créditos do sujeito passivo
Conforme publicação de 23 de maio
deste ano de 2019, a 7ª Turma do TRF1 negou provimento à apelação de uma
empresa de assessoria tributária contra a sentença, da 6ª Vara da Seção
Judiciária de Minas Gerais, que considerou que a legislação tributária veda a
compensação com créditos de terceiros oriundos de decisões judiciais não
transitadas em julgado pelo contribuinte cessionário.
Segundo os impetrantes, o direito
de compensação foi autorizado judicialmente por meio de decisão cautelar,
afastando a exigência do trânsito em julgado como requisito para a compensação.
Consta dos autos que os
requerentes formularam administrativamente pedido de compensação tributária com
base em créditos discutidos judicialmente em sede de medida cautelar, na
primeira instância, confirmada pelo TRF 5ª Região, que favorecia a parte
impetrante ao reconhecer o seu direito ao creditamento do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI).
A Fazenda Nacional (FN) interpôs
recurso especial e extraordinário em face da decisão que permitia a efetivação
de compensações tributárias antes mesmo do trânsito em julgado; o órgão
colegiado, por sua vez, recebeu os recursos com efeito suspensivo, impedindo-se
a exigibilidade dos créditos tributários.
O relator, juiz federal convocado Marcel Peres de Oliveira, destacou que após a
edição da Lei nº 11.051/2004, que alterou o art. 74 da Lei nº 9.430/96, ficou estabelecido
no § 12 que será considerada não declarada a compensação nas hipóteses em que o
crédito seja de terceiros.
De acordo com o magistrado, a norma referenciada está em consonância com o art.
170 do Código Tributário Nacional (CTN) que, no seu caput, previu que a
compensação somente pode ser autorizada com créditos do sujeito passivo.
Foi
unânime a decisão ocorrida nesse processo, sob o nº:
0033011-57.2007.401.3800/MG
Fonte:
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
COMENTÁRIOS
DE PRADO GARCIA ADVOGADOS, POR SEU SÓCIO-FUNDADOR, DR. PLÍNIO GUSTAVO PRADO
GARCIA
Essa decisão só é correta num ponto: ainda não havia o
reconhecimento da cessão e transferência do crédito tributário por decisão
judicial final (trânsito em julgado). Aplicável aí o disposto no artigo Art. 170-A do CTN: “ É vedada a compensação mediante o aproveitamento de
tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito
em julgado da respectiva decisão judicial. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)”
Apenas nesse sentido se
poderia impedir a efetivação dessa cessão e transferência de crédito para fins
de compensação tributária pelo cessionário no lugar do cedente.
No mais, os fundamentos
jurídicos dessa decisão estão equivocados.
Nesse sentido, não há como
aceitar o entendimento do relator, juiz federal convocado Marcel Peres de
Oliveira, segundo o qual após a edição da Lei nº 11.051/2004, que alterou o
art. 74 da Lei nº 9.430/96, ficou estabelecido no § 12 que será considerada não
declarada a compensação nas hipóteses em que o crédito seja de terceiros.
O instituto da cessão e
transferência de créditos é instituto de Direito Civil, respeitado pelo artigo 110 do Código
Tributário Nacional. Assim, o crédito objeto de cessão de seu titular a um
terceiro deixa de ser crédito daquele titular para seu sucessor, que, portanto,
não mais será um terceiro perante o devedor. Crédito financeiro, como é a
natureza do crédito tributário, é passível de cessão e transferência como
qualquer outro crédito sob as normas do Código Civil.
Ofendendo o artigo 110 do CTN
sobressai a ilegalidade da alteração do artigo 74 da Lei 9.430/96, pela Lei
11.051/2004, no seu parágrafo 12. Em outras palavras, continua o credor da
Fazenda Pública com o direito de ceder e transferir a terceiros seu crédito
tributário para fins de aproveitamento desse crédito pelo cessionário no
pagamento de débitos tributários próprios junto à mesma Fazenda Pública, por
meio do instituto jurídico da compensação de créditos entre credores e
devedores recíprocos.
Como a cessão e a transferência
de direitos creditórios se coadunam com a livre disposição de elemento
integrante do patrimônio individual, esse instituto jurídico se insere no
âmbito do direito de propriedade e da livre disposição do que a cada um pertença.
Tem, portanto, sustentáculo constitucional.
Nesse sentido, o artigo 170 do
Código Tributário Nacional, mencionado na decisão ora sob comentário, não tem
força para impedir a cessão e transferência de créditos tributários do cedente
ao cessionário para que este venha a requerer
a compensação tributária no pagamento de tributos que, por ele,
cessionário, seriam ou sejam devidos ao ente tributante.
Por último, ao contrário do que sustenta o juiz federal
relator, não cabe neste caso a invocação do art. 123 do CTN, que nega validade aos negócios jurídicos entre
particulares para fins de produção de efeitos sobre a responsabilidade pelo
pagamento de tributos.
Esse artigo não se aplica, pois
não se trata aqui de responsabilidade pelo pagamento de tributos, mas se débito
da Fazenda Pública diante de um seu credor, cujo direito de cessão e transferência desse
crédito a terceiros se inclui no âmbito de sua exclusiva decisão. Quem tem
direitos, não pode deles ser privado por ato de quem a ele seja devedor.
Lembre-se,
por último, que a cessão e transferência de créditos entre credores e devedores
perante a Fazenda Pública é direito constitucionalmente reconhecido inclusive
para fins de operações relacionadas com o pagamento de precatórios judiciais