quinta-feira, julho 14, 2005

Entre a cruz e a espada, o direito de defesa.

Por paradoxal que pareça, nossos direitos individuais se tornam cada vez mais limitados apesar de termos uma Constituição Federal que afirma ser este um Estado Democrático de Direito.
Essas limitações advêm de leis inconstitucionais e do emprego de métodos inconstitucionais na aplicação de leis constitucionalmente válidas.
É o que ocorre ultimamente, sob o governo Lula, mormente no campo tributário, em que a Polícia Federal passa a ser utilizada como instrumento de força e de intimidação, onde apenas bastaria a lavratura de autos de infração por auditores da Secretaria da Receita Federal, com intimação do contribuinte para defender-se na via administrativa.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal já decidiu (HC nº 81.611/SP, relator ministro Sepúlveda Pertence) que nos crimes contra a ordem tributária descritos no art. 1º da Lei nº 8.137/90 não há justa causa para a instauração da ação penal sem prévia decisão na esfera administrativa sobre o suposto débito tributário. Assim, não haverá crime consumado se não houver, antes, a confirmação do débito por meio de lançamento definitivo. É o que se denomina crime material, diferentemente dos classificados como crimes de mera conduta.
Várias outras decisões do STF corroboram esse entendimento (entre elas, HC nº 83.414/RS, relator ministro Joaquim Barbosa, v.u. da Primeira Turma, e HC nº 84.092/CE, relator ministro Celso de Mello, v.u., Segunda Turma).
Isso evidencia a falta de justa causa para se imputar ao contribuinte conduta delituosa na omissão de impostos, se essa omissão não estiver comprovada na via administrativa mediante a exigibilidade do crédito tributário e pela determinação do valor por ele devido aos cofres públicos.
O mesmo raciocínio deve ser aplicado às demais hipóteses envolvendo supressão total ou parcial de tributos -- que não podem ser classificadas nem punidas como crime de mera conduta -- por evidenciarem situações de interesse meramente arrecadatório. Assim, há, aí, de se determinar se o fato alegado efetivamente ocorreu e, caso tenha ocorrido, qual seria o montante do tributo devido. Casos em que a atuação administrativa do Fisco não pode ser afastada, pois não cabe à autoridade policial nem judicial invadir área de competência da Administração Pública.
Em outras palavras, não se pode negar ao contribuinte o direito de defesa em autuações fiscais, e não poderá haver a instauração de processo penal tributário enquanto não tenha sido reconhecido na via administrativa a exigibilidade do crédito tributário e definido o respectivo valor.

Em suma, cabe a impetração de "habeas corpus" a favor dos acusados por crimes contra a ordem tributária em todas essas situações aqui descritas, eis que ninguém pode ser processado criminalmente quando a matéria delituosa não tenha sido antes resolvida na via administrativa, no âmbito do competente processo administrativo-tributário.