segunda-feira, julho 18, 2005

De volta à Daslu

Quando, em 5 de junho passado, aqui escrevi artigo sob o título "Daslu e Miséria", não poderia ter advinhado que essa loja viesse a sofrer, em julho corrente, incursão da Polícia Federal sob operação com características de ofensiva militar e mesmo com denominação de operação de guerra. Inobstante o "glamouroso?" título de "Operação Narciso".
Se me perguntarem qual minha opinião, agora, sobre a Daslu, continuo afirmando tudo o quanto afirmei naquele artigo de junho. É uma pena que, no Brasil, poucas sejam as lojas desse quilate, pois esse pequeno número de tais catedrais do luxo só pode indicar o parco poder aquisitivo dos brasileiros.
Sempre defendi o direito de escolha, que só pode ser exercido por quem tem liberdade de escolher. Mas a liberdade de escolha exige, também, a existência de pluralidade de objetos dessa mesma escolha. Assim, não basta que tenhamos o direito de contratar ou de não contratar. No regime de monopólio só nos restará a submissão ao monopólio, a menos que possamos optar por não adquirir o produto ou o serviço monopolizado.
Daí a beleza da conjugação da liberdade de escolha com a pluralidade de objetos sobre os quais essa escolha possa recair. Ora, a pior escolha é aquela que não possamos fazer.
Isso significa que a Daslu e suas congêneres se apresentam como alternativas àqueles que, tendo condições financeiras, façam ali suas compras, ao invés de fazê-las no exterior. Sem negarmos a quem quer que seja o direito de optar por compras noutros lugares ou noutros países.
Há pecado no luxo? Ou será que o pecado não está, exatamente, na inveja? Se o luxo nos aproxima do belo, porque deveríamos buscar o feio? Se o luxo exige qualidade, porque haveríamos de optar pelo produto inferior ou de má qualidade?
O que importa, pois, é haver essa possibilidade de escolha e de condicionarmos o atendimento de nossos sonhos ou necessidades às reais condições de nosso bolso. Mal nenhum existe em querer o melhor, em preferir o que mais nos agrade. Que busquemos, pois, realizar nossos sonhos e alcançar a felicidade.
Não quero dizer que a felicidade se encontre nas coisas, mas que ela pode advir, também, do modo pelo qual encaramos as coisas que nos cercam. De outra parte, não creio que a miséria, a pobreza, a carência nos tragam felicidade. É claro que é possível ser feliz a partir de uma atitude de desprendimento diante das coisas materiais. Mas, quem será mais desprendido? O rico, que tudo ou quase tudo tem, ou o pobre que pouco tem? A resposta que se pode dar, creio, é a seguinte: tanto um quanto o outro pode não ter desprendimento, como qualquer deles pode ser desprendido. Assim, o problema não é a riqueza, em si mesma, mas o grau de apego que cada um de nós pode ter pelas coisas. Desse modo, o rico pode ser desprendido por não ter apego às coisas que o cercam (são meras utilidades, passíveis de substituição), enquanto o apego às coisas pode ser a característica da personalidade de qualquer pobre (mas, certamente, não de todos).
Muito interessante, não apenas porque coincida com meu modo de pensar, a opinião manifestada por Gilles Lipovetsky, filósofo e professor da Universidade de Grenoble, na França, a respeito da importância do luxo na vida de cada um de nós, brasileiros ou estrangeiros, ao redor do mundo.
Para ele, o luxo é, por assim dizer, movido pela busca do belo. Pobre também gosta de luxo. O carnaval exibe o luxo. Pobre não quer miséria. O luxo exige produtos de qualidade. O luxo gera empregos, faz a economia girar. Mais detalhes podem ser encontrados na entrevista a Laura Greenhalgh, no caderno "Aliás" de "O Estado de S. Paulo" de 17 de julho corrente.
De fato. O luxo é um atrativo e um estímulo. Mesmo para os pobres, que, com toda certeza, detestam a pobreza. E esta só pode ser reduzida através da educação e de oportunidades de trabalho e de emprego. Nesse sentido, programas governamentais clientelísticos de nada servem senão para manter o povo submetido ao cabresto governamental. Como se cada eleitor tivesse de trocar o voto por "favores governamentais".
Portanto, por mais que se qualifiquem de elitistas lojas como a Daslu, pior seria se nosso país não tivesse mercado consumidor para, pelo menos, uma Daslu.
O que não podemos admitir são esses absurdos procedimentos policialescos, com detenção de empresários, sob a alegação de prática de delitos tributários. O meio adequado, constitucional e legal, de apuração de créditos tributários passa primeiro pela via da fiscalização administrativa.
Não há delito tributário se não há tributo exigível nem débito pendente. E, quando houver, deve ser cobrado por meio da competente execução fiscal, abrindo-se ao suposto devedor amplo direito de defesa. É o que exige e a nos garante a lei maior do País: a Constituição da República.

7 Comments:

Anonymous Anônimo said...

A jurisprudência hoje exige o exaurimento da esfera administrativa apenas nos delitos tributários - Lei 8.137/1990.
Curioso que na maioria das outras esferas, o âmbito administrativo e o penal são tidos como autônomos, e isto é normal.
Nada contra a Daslu e o luxo que ela vende, desde que ela pague os tributos devidos e não pratique outros delitos, tais como descaminho (pelo uso de fatura fraudada com valor inferior ao real, implicando pagamento a menor de tributos aduaneiros), evasão de divisas (pela remessa extra-oficial do pagamento das aquisições) e formação de quadrilha (já que são necessárias, em regra, mais de 3 pessoas para cometerem estes tipos penais).
E nenhum deles exige o exaurimento da esfera administrativa.
Se a ação foi televisionada? Com esta movimentação de um número razoável de policiais, isto quer dizer que foi a PF quem avisou a imprensa? E se a PF tivesse impedido a imprensa de chegar perto da Daslu, seria tachada do quê?

10:47 PM  
Blogger Plinio G. Prado Garcia said...

Caro Witt,
Exigir que a Daslu (ou quem que que seja) "pague os tributos devidos e não pratique outros delitos" sem que antes lhe seja dado o direito de defesa, representa, na verdade, inversão da ordem natural das coisas. É condenar adredemente, em desrespeito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa.
Não se deve pôr o carro à frente dos bois.

10:41 PM  
Anonymous Anônimo said...

Boa noite Plínio,

achei interessante esta análise do caso Daslú . Realmente o caso está dando muiito pano pra manga. Afinal de contas estamos no Brasil, um país onde a baixa instrução impera . Digo isto porque o povo parece pixar a Daslú somente porque esta vende produtos caros para pessoas ricas. Conforme discutimos antes , qual é a culpa que a Dona Eliana Tranchesi tem sobre o fato de o nosso país ter tantos miseráveis ? Se o povo tivesse uma condição um pouco melhor de analisar as coisas chegaria à conclusão de que os nossos governos anteriores e o atual é que nunca gerou empregos suficientes e nunca investiu de acordo na educação também porque o brasileiro é um povo pacífico e nunca cobrou resultados concretos dos governantes . Tivessem êstes feito isto , não estariamos nesta condição lastimável de diferença de distribuição de renda que permeia o perfil da população brasileira.

Gostei também desta análise :

" Não quero dizer que a felicidade se encontre nas coisas, mas que ela pode advir, também, do modo pelo qual encaramos as coisas que nos cercam. De outra parte, não creio que a miséria, a pobreza, a carência nos tragam felicidade. É claro que é possível ser feliz a partir de uma atitude de desprendimento diante das coisas materiais. Mas, quem será mais desprendido? O rico, que tudo ou quase tudo tem, ou o pobre que pouco tem? A resposta que se pode dar, creio, é a seguinte: tanto um quanto o outro pode não ter desprendimento, como qualquer deles pode ser desprendido. Assim, o problema não é a riqueza, em si mesma, mas o grau de apego que cada um de nós pode ter pelas coisas. Desse modo, o rico pode ser desprendido por não ter apego às coisas que o cercam (são meras utilidades, passíveis de substituição), enquanto o apego às coisas pode ser a característica da personalidade de qualquer pobre (mas, certamente, não de todos). "

O fato é que no país do futebol e do carnaval , como dizia Joãozinho Trinta, o povo não gosta de miséria, gosta de luxo ... (o resto da frase todos conhecem) e como não tem , nutre um sentimento de raiva em relação a quem tem , daí tá gerada a confusão...

Abraços,

Paulo Mello

8:21 PM  
Anonymous Anônimo said...

Best regards from NY! » »

11:51 PM  
Anonymous Anônimo said...

Cool blog, interesting information... Keep it UP »

4:33 PM  
Anonymous Anônimo said...

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3:16 PM  
Anonymous Anônimo said...

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3:31 PM  

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