Bolsonaro pode evitar condenação no STF
Sim, o presidente Jair Messias Bolsonaro pode evitar sua condenação no Supremo Tribunal Federal!
Ainda há essa possibilidade. Basta juntar aos autos da ação penal uma petição intercorrente, com fortes fundamentos jurídicos ainda não submetidos ao crivo do Tribunal.
Movido pelo meu profundo senso de justiça e sem qualquer intuito de buscar remuneração por essa iniciativa, espero que essa minha petição possa ser juntada aos autos da ação penal.
Para que isso possa ocorrer, é preciso apenas Bolsonaro autorizar seus atuais advogados a firmarem substabelecimento à minha pessoa, com reserva, dos poderes a eles outorgados.
Para conhecimento público, reproduzo aqui a íntegra dessa petição intercorrente, como segue:
"
EXCELENTÍSSIMO
SENHOR MINISTRO RELATOR ALEXANDRE DE MORAES - PRIMEIRA TURMA DO EXCELSO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL
Ação Penal 2668
Petição intermediária de arguição de nulidade
absoluta de foro
JAIR MESSIAS BOLSONARO, por seu advogado infra-assinado, nos autos desta Ação Penal 2668 em que é um dos réus, vem, por meio desta petição intermediária:
a)
juntar aos autos o substabelecimento de poderes com reserva de
direitos ao substabelecente, e
b) com base no
artigo 5º, inciso XXXIV da Constituição Federal (direito de petição), e artigo
277 do Código de Processo Civil, arguir nulidade absoluta dessa Ação Penal, ao
menos em relação à sua pessoa, pelos motivos de fato e de direito a seguir
expostos.
I – DOS FATOS
O
réu responde a essa Ação Penal nesse Excelso Supremo Tribunal como se fosse titular
do direito a foro por prerrogativa de função, a que se refere o artigo 102.1,”b”
da Constituição Federal.
Ainda
que, em tese o fosse, jamais poderia estar sendo processado diretamente perante
esta Suprema Corte. Muito menos a ser aqui julgado e condenado.
Como
se passa a demonstrar, é caso de incompetência absoluta de foro para a
instauração, processamento e julgamento desta Ação Penal contra sua pessoa.
Exatamente
por isso, esta questão em nada é prejudicada pela discussão e decisão desse
Excelso Supremo Tribunal sobre se o foro por prerrogativa de função vincula-se ao exercício
atual do cargo. Ou se subsiste mesmo após o término do mandato, mas desde que o
crime tenha sido cometido durante o exercício das funções públicas. Tema da Questão
de Ordem na Ação Penal 937.
Acrescente-se que esta arguição intercorrente de nulidade
absoluta de foro nada tem a ver, também, com a inclusão de ex-mandatários no
polo passivo dessas ações penais, como se no cumprimento do mandato ainda
estivesse.
Do dano
irreparável
Mantido esse foro por prerrogativa de função, o réu sofre dano
irreparável por privado ficar do incontestável direito ao foro comum,
à ampla defesa, ao contraditório e a recursos às instâncias superiores.
Não terá a quem recorrer.
Não há justiça em foro único, sem direito de recurso às
instâncias superiores.
Assim, descabe alegar que o réu esteja exercendo ampla defesa
e o contraditório nessa única instância judicial. Inicial e, ao mesmo tempo,
final.
A
história do foro por prerrogativa de função
Saliente-se que o foro dito privilegiado é uma inovação no
Direito Constitucional brasileiro.
Como se pode ler na página do Senado Federal, artigo assinado
por Milena Galdino:
“Ainda no período da escravidão e
apenas dois anos após a independência da coroa portuguesa, a prática de foro
especial já estava proibida: a Constituição de 1824 dizia que à exceção de
causas próprias dos juízos particulares não haveria foro privilegiado nem
comissões especiais nas causas cíveis e nos crimes (artigo 179, inciso XVII).
As constituições que vieram em
seguida mantiveram a mesma linha. A de 1891, que marcou o início da República,
teve texto semelhante ao do império: “À exceção das causas que, por sua
natureza, pertencem a juízos especiais, não haverá foro privilegiado”, instruiu
o artigo 72, § 23. A de 1934 acrescentou que, além de não haver foro
privilegiado, não haveria tribunais de exceção, mas continuou admitindo juízos
especiais em razão da natureza das causas (artigo 113 § 25).
A Constituição de 1937 nem chega a
mencionar foro especial, e a de 1946 reitera que “não haverá foro privilegiado
nem juízes e tribunais de exceção” (artigo 141, § 26). Trinta anos depois a
mesma orientação foi repetida pela Constituição militar, de 1967, em seu artigo
150, § 15.
Ao promulgar a Constituição de 1988,
a Assembléia Nacional Constituinte manteve nos direitos e garantias
fundamentais a proibição de juízo ou tribunal de exceção (artigo 5º, inciso
XXXVII), porém abriu as várias possibilidades de foro especial já mencionadas.”
(Fonte:https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2012/10/10/ foro-especial-comecou-na-constituicao-de-1988)
Desde a Constituição do Império, de 1824, passando pela
Constituição Republicana de 1891, pela Carta Política de 1934, pela
Constituição de 1946, e no regime militar de 1964, como, na leitura do artigo
150, §15, da Constituição de 1967:
“A lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos
a ela inerentes. Não haverá foro privilegiado nem tribunais de exceção”.
Esse texto permaneceu inalterado pela Emenda Constitucional 1
de 1969.
Não consta que os constituintes de 1988, ao produzirem a
Constituição Cidadã, instituindo esse foro por prerrogativa de função, pretendessem
contrariar qualquer cláusula pétrea da própria Constituição, negando ao acusado
ou réu o direito de optar por ser processado e julgado perante o juiz
natural, com direito à ampla defesa e a recurso às instâncias superiores.
Basta constatar a inexistência na Constituição vigente de
qualquer disposição vedando ao acusado o direito de opção pelo foro
comum, natural. Se houvesse, seria contraditória e inválida.
A possível explicação do foro por prerrogativa de função
estaria em impedir que esses “privilegiados” ficassem sujeitos a ações
judiciais instauradas contra eles em quaisquer foros e instâncias deste nosso
Brasil. Ou mesmo à perseguição política.
Ademais, não se confunde a pessoa com
sua função. Esta é apenas a “conditio sine qua non” para seu titular ter o direito
ao foro “privilegiado”. Vale dizer, um direito só cabível a quem a função
exerça.
Mesmo sendo esse foro “prerrogativa” do acusado, essa
prerrogativa não tem força cogente para negar ao investigado, acusado ou réu o direito
de optar pelo foro comum.
A prerrogativa de foro especial como direito do
investigado, acusado ou réu não se convola em dever de se submeter a um
foro que seja ao mesmo tempo instância inicial e final, ou seja, instância
única. Sem direito de recurso às instâncias superiores.
II - DO
DIREITO
A vigente Constituição Federal fundamenta-se no Estado de
Direito embasado nos seus princípios e na garantia de todos contra o arbítrio.
Os direitos fundamentais que acolhe e protege são a base do
ordenamento jurídico vigente no País.
Na hierarquia das leis, é a lei fundamental, que se projeta
ao topo da sua pirâmide.
Não admite a prevalência da forma sobre a essência.
Da norma sobre o direito.
No embate entre o direito material, substantivo, e o direito
processual, adjetivo, este àquele se submete.
O artigo 5º, inciso LV, da Constituição garante que “aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes.”
Temos aí um norteador a ser seguido não apenas pelo
intérprete, porque o óbvio está no fato de que ao julgador não será lícito nem
admissível subtrair-se de aplicar a lei e o ordenamento jurídico no exercício
do múnus decorrente do cargo judiciário que ocupe. Cargo esse que lhe impõe o dever
de julgar sem se desviar do ordenamento jurídico.
O artigo 92 da Constituição, que trata da competência dos
tribunais, evidencia o cabimento do direito de recurso às instâncias
superiores.
Sobressai daí ser esse um direito substantivo, a
prevalecer sobre o adjetivo, processual.
Esse direito de recurso é garantido também pela
Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São José da
Costa Rica, no seu artigo 8.2.h:
“2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se
presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o
processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias
mínimas:
(...)
h) direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal
superior.”
A República Federativa do Brasil é uma das suas signatárias.
Essa Convenção se insere no ordenamento jurídico pátrio por
força do que dispõe o artigo 5º, §§ 1º e 2º da Constituição Federal de 1988.
Tem força cogente. E, por isso os direitos nela enunciados têm natureza de
norma constitucional de aplicação imediata.
Assim, o direito ao juiz natural, à ampla defesa e aos
recursos a ela inerentes, como cláusula pétrea na Constituição, desautoriza a prevalência
de foro privilegiado e de tribunais de exceção.
E, nesse particular, essa Suprema Corte seria um tribunal de
exceção em sendo instância única para julgar quaisquer acusados, diretamente.
Destaque-se, como exemplo, que a competência para julgar
crimes contra o Estado Democrático de Direito, previstos na Lei 14.197/2021, é
da Justiça Federal. Vale dizer: Não é da competência originária dessa Suprema
Corte.
Essa competência da Justiça Federal decorre do artigo 109,
inciso IV, da Constituição para crimes praticados em detrimento de bens,
serviços ou interesses da União, excluídas as contravenções e ressalvada a
competência da Justiça Militar.
II.I - Da
jurisprudência superada ou inaplicável
Vejamos:
1. A
jurisprudência desse Excelso Tribunal sobre a impositividade do foro por
prerrogativa de função; do entendimento de que sua lógica seria a de garantir a
imparcialidade e independência no julgamento, considerando a relevância dos
cargos, e sobre a impossibilidade de o réu renunciar a esse foro, não prevalece
sobre os fundamentos de direito desta petição intercorrente.
2. Como
se julga a pessoa e não a função que ocupe, o foro por prerrogativa de função é
um fator meramente circunstancial. Entretanto, a toda pessoa (autoridade ou
não) é constitucionalmente assegurado o direito ao juiz natural, ao foro
competente e aos recursos às instâncias superiores. O que não lhe oferece o
foro único nesse Supremo Tribunal Federal.
3. Ademais,
deveria essa jurisprudência considerar o implícito direito de opção do réu pelo
foro comum e o direito de sempre poder arguir a incompetência
absoluta desse foro dito privilegiado, em qualquer fase da ação penal.
Inclusive por consequência de renúncia ao cargo ou por não mais exercê-lo.
4. Esta
petição intercorrente e seu pedido final não são afetados nem prejudicados pelo
decidido por essa Suprema Corte na Ação Penal 937/218, restringindo o alcance
do foro privilegiado a deputados federais e senadores, determinando que esse
foro se aplica apenas a crimes cometidos durante o exercício do cargo e
relacionados às funções desempenhadas.
5. Para
os efeitos do pedido formulado ao final desta petição esse precedente é inaplicável
e ineficaz ao fixar que, após o fim da instrução processual (com a intimação
para alegações finais), a competência não é mais afetada por mudanças no cargo.
E que essa decisão não permite declínio voluntário, ou mesmo que sirva para
definir limites objetivos para a manutenção do foro.
6. Também
não prevalece sobre os fundamentos de direito e o pedido constantes desta
petição intercorrente a recente decisão de março deste ano de 2025, em que essa
Suprema Corte decidiu, por 7 votos a 4, que o foro privilegiado para deputados
e senadores pode ser mantido mesmo sido cometidos durante o exercício do cargo
e em razão dele. Essa decisão reforçaria, equivocadamente, a ideia de que o
foro seja impositivo e não possa ser simplesmente renunciado para manipular a
competência jurisdicional.
7. Pondere-se
que cargo ou função são situações ocasionais e não pessoas. Não se
processa cargo nem função exatamente por não serem pessoas. O óbvio nem sempre
é evidente para quem não queira vê-lo.
8. Acrescente-se
a isso que normas sobre foro não se sobrepõem ao direito público subjetivo
inerente à supremacia do direito material sobre normas meramente
processuais.
II.II – Da interpretação conforme e suas consequências
Como não pode haver desarmonia nem conflito entre as
disposições da vigente Constituição Federal, temos de passar a uma
interpretação que afaste aí qualquer incongruência. Ou seja, o que no jargão
jurídico se denomina “interpretação conforme e sem redução de texto”. Ou apenas
“interpretação conforme”.
Essa interpretação conforme, no presente caso, se materializa
no implícito reconhecimento do direito do investigado, acusado ou réu,
enquanto “favorecido” pelo foro por prerrogativa de função, de renunciar a esse
direito. Assim, poderá fazê-lo a qualquer tempo no curso da ação penal
nessa Excelsa Corte. Mormente diante do fato de não lhe ter sido oferecida essa
opção pelo foro comum.
Decorre disso que a todo acusado diretamente junto a essa Suprema
Corte cabe o implícito direito de declinar desse foro, optando por
outro, de instância inferior, menos gravoso.
Assim, o foro por prerrogativa de função junto a esse Excelso
Supremo Tribunal Federal deve ser reconhecido – repita-se - como um direito
do acusado. Não como uma imposição inarredável.
Esse inquérito ou ação penal seria distribuída a uma das
varas de primeira instância da Justiça Federal, que seria a do juiz natural,
ficando assegurado ao investigado, acusado ou réu a ampla defesa e os recursos
a ela inerentes. Como é de direito a todos os não “contemplados” com o foro por
prerrogativa de função.
Como isso não vem ocorrendo quanto ao foro privilegiado, têm-se
as seguintes consequências:
1.
Todo investigado, acusado ou réu diretamente
junto a essa Suprema Corte tem o implícito direito de declinar desse
“privilégio”.
2.
A Constituição não veda seu direito de
renúncia. Nem autoriza essa Corte a indeferi-lo.
3.
Também não impõe a perda do cargo ou do
mandato na renúncia ao foro “privilegiado”.
4. Cabe
a esse Excelso Tribunal, ao início do processo, oferecer ao investigado,
acusado ou réu a opção por ser julgado perante foro de instância inferior.
5. Esse direito do investigado, acusado ou réu
não precisa estar expresso na Constituição. É implícito.
6. Se já ocorrida, só será válida, aí, nessa
Suprema Corte, em benefício a qualquer deles, a decisão final que lhe tenha
sido favorável.
7. Será nula e de nenhum efeito jurídico contra qualquer
deles a decisão restritiva de direitos ou condenatória, quando tenha declinado
desse foro especial, ou mesmo quando, sem dele ter declinado, não lhe tenha
esse Excelso Tribunal oferecido a opção de julgamento em foro que lhes
garanta o direito à ampla defesa e aos recursos cabíveis.
8. Essa
nulidade pode ser arguida a qualquer tempo no curso do processo ou mesmo após o
seu encerramento. Nesse último caso, por revisão criminal.
9. Saliente-se que não
se processa nem se condena o cargo, mas seu ocupante. Nem o mandato, mas o
mandatário.
10. O direito ao juiz
natural, ao foro competente, à ampla defesa e aos recursos a ele inerentes são
do investigado, acusado ou réu. Não do cargo, nem do mandato.
11. Uma norma de competência de foro, mesmo constante da
Constituição, não prevalece nem pode prevalecer sobre quaisquer direitos
fundamentais do acusado ou réu.
12. Exige-se apenas uma interpretação conforme à Constituição
nesse embate jurídico, a sobrepor o direito material, substantivo, ao direito
adjetivo, processual, meramente procedimental.
Assim, verifica-se no presente caso
que:
1.
O réu nem mais é detentor do direito ao foro por prerrogativa de
função.
2.
Esse direito não pode ser convolado em dever de ser aí mantido
para ser processado e julgado diretamente perante essa Suprema Corte.
3.
Mesmo se continuasse sendo detentor desse direito ao foro por prerrogativa
de função ou como mandatário, teria de lhe ter sido oferecida a opção de
ser julgado perante o juiz natural no foro criminal competente em primeira
instância da Justiça Federal.
4.
O dever de esse Supremo Tribunal Federal oferecer essa opção ao investigado,
acusado ou réu não precisa estar expresso na Constituição. Está nela implícito.
5.
Não consta que essa opção tenha sido oferecida ao réu.
6.
A ausência desse oferecimento evidencia ofensa direta ao direito ao
juiz natural, à ampla defesa e aos recursos às instâncias superiores, amparados
em cláusulas pétreas da Constituição.
7.
Esse dever se impõe por força da interpretação conforme e sem
redução de texto do artigo 102, 1, “b” da Constituição Federal no confronto com
as referidas garantias de direito material.
8.
Isso decorre do fato de que nenhuma disposição constitucional
tratando de foro judicial pode se contrapor a quaisquer dos direitos que a
Carta Magna elege como fundamentais. Como cláusulas pétreas, que nem o
Congresso Nacional pode alterar ou ofender.
9.
Essa linha de argumentação faz cair por terra os precedentes dessa
Suprema Corte no sentido da impositividade desse foro e da impossibilidade de
sua renúncia pelo investigado, acusado ou réu.
J U S T I Ç A!
Brasília.
Plínio Gustavo Prado Garcia
OAB/SP 15.422
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