segunda-feira, maio 21, 2018

Pagamentos internacionais e seu tratamento legal no Brasil


                                                                                                                 Plínio Gustavo Prado Garcia
                                                                     
Esse tema nos leva a algumas considerações a partir de determinadas premissas iniciais.
A primeira delas se relaciona com o próprio tema do pagamento como meio de cumprir obrigação contratual ou decorrente de imposição legal.
A disciplina legal
O pagamento, como meio extintivo de obrigação, é disciplinado nos artigos 304 a 327 do Código Civil de 2002.
É, assim, estipulado que qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando dos meios conducentes à exoneração do devedor, mesmo se houver oposição do credor.
Terceiro não interessado também pode pagar a dívida em nome e por conta do devedor, se este a isso não se opuser.  A oposição a esse pagamento deve chegar ao conhecimento do terceiro para reputar-se válido, ou no caso de ter ocorrido à revelia do devedor, cabe a este o direito de ratificar o pagamento ou de exigir do terceiro os mesmos direitos que poderia exigir do credor para a quitação da dívida.
Pode acontecer de uma dívida já ter sido paga. E, nesse caso, haverá pagamento indevido quando feito no caso de dívida já paga, independentemente  de o pagamento ter sido feito pelo próprio devedor ou por terceiro em nome e por conta daquele. O direito à restituição cabe a quem tenha pagado o indevido ou mais do que o devido.
Todavia, se o devedor tinha meios para ilidir a ação, fica ele desobrigado a reembolsar aquele que haja efetuado o pagamento, quando este tenha ocorrido com desconhecimento ou com oposição dele, devedor.
A quem pagar
O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito. Outras considerações aplicáveis ao tema se relacionam com o meio e o local do pagamento.
O objeto do pagamento
Note-se que o objeto do pagamento dependerá do que houver sido pactuado entre as partes contratantes. Assim, o pagamento pode consistir em obrigação de dar (dar algo em pagamento, como qualquer bem de valor econômico ou valor financeiro) ou de fazer (prestar algum serviço a título oneroso). Pode ainda consistir em obrigação de não fazer, quando alguém convencione a abstenção de ato ou de fato perante a outra parte contratante.
A moeda aplicável
Cumpre salientar, em primeiro lugar, que nenhum negócio jurídico formalizado no País e que aqui tenha de ser cumprido pode ser convencionado senão em moeda corrente nacional.  
Mas, uma coisa é convencionar e a outra é como cumprir o que foi convencionado. Via de regra, a obrigação deve ser cumprida nos termos, prazos, cláusulas e condições avençados entre as partes contratantes.
No entanto,  a extinção da obrigação de pagar pode ocorrer por meios outros que não os da convenção formalizada entre as partes contratantes. Basta que o credor aceite como pagamento outro meio que não o inicialmente pactuado com o devedor.
Assim, a regra legal geral é de que as dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e pelo valor nominal.
Todavia, não há nem pode haver impedimento a que o credor possa dar por cumprida e satisfeita a obrigação, recebendo seu crédito por qualquer outro meio legal válido para a extinção da dívida e de sua quitação. Quem pode o mais (perdoar a dívida), pode o menos: aceitar como pagamento qualquer outro bem de natureza econômica ou conteúdo financeiro.
Pagamento nos negócios internacionais
No que nos interessa, neste artigo, examinamos agora o que fazer para resolverem-se obrigações consistentes em pagamentos nos negócios internacionais em que uma das partes contratantes seja pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil.
Nesse sentido, ninguém pode ser impedido de receber,  no Brasil ou no exterior, sendo pessoa física ou jurídica aqui residente ou domiciliada, pagamento que seu devedor faça por qualquer meio  que não o meio previsto no contrato entre eles firmado. Isso se explica porque ao credor é reservado o exclusivo direito de dar por cumprida a obrigação por meio distinto daquele previsto na convenção. Direito que não se estende ao devedor, pois sem a concordância do credor, ele, devedor, deve ater-se aos termos da convenção. Assim, quando muito, poderá o devedor oferecer como pagamento meio distinto do avençado e, no assim fazer, ficar à espera da aceitação ou não da proposta que seja feita ao credor.
Logo, apesar da exigência legal de que todos os contratos firmados sob a égide da legislação brasileira tenham a moeda corrente nacional como moeda legal e seu pagamento como meio de extinção da obrigação, inexiste restrição a impedir o credor de receber o pagamento por qualquer outro meio não previsto no negócio jurídico entre eles entabulado.
Assim, é lícito ao credor receber no Brasil ou em qualquer outro país, seu crédito até mesmo em moeda estrangeira, ao câmbio do dia do pagamento, do mesmo modo que poderia recebê-lo em ouro, em jóias, em títulos de crédito, em ações, em veículos, etc.
Conclusão
Conclui-se, portanto, que o meio pelo qual uma obrigação deva ser cumprida será, via de regra, o meio previsto no pacto ou no contrato firmado entre as partes contratantes. É lícito, no entanto, ao credor, dar por cumprida a obrigação por qualquer outro meio acertado de comum acordo com o devedor ou seu representante legal, após a formalização de seu contrato ou convenção. Inclusive quando uma das partes seja domiciliada ou estabelecida no País, e a outra, no exterior.
E esse pagamento tanto poderá ser efetuado pelo próprio devedor ao credor, como por terceiro em nome e por conta do devedor. É irrelevante se esse pagamento será feito no Brasil ou no exterior, pois relevante é que a obrigação de pagar seja cumprida pelo devedor e aceita pelo credor.