domingo, novembro 26, 2023

Habeas corpus e a lei do abuso de autoridade

Como se sabe, o habeas-corpus é considerado um remédio constitucional. Vale dizer, um instrumento processual para garantir a liberdade de alguém, quando a pessoa for presa ilegalmente ou tiver sua liberdade ameaçada por abuso de poder ou ato ilegal.

Está previsto no artigo 5o, inciso LXVIII, da Constituição Federal de 1988, que assim dispõe:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;…”

São cabíveis assim, dois tipos de habeas-corpus:

1) Repressivo, caso mais comum nos tribunais, ajuizado quando a prisão ilegal já ocorreu; e,

2) Preventivo, também chamado de “salvo-conduto”, para evitar que a coação ilegal da liberdade aconteça.

Em nivel infraconstitucional, é normatizado principalmente nos artigos 647 a 667 do Código de Processo Penal (Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941).

Vejamos:

“Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.

Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:

I - quando não houver justa causa;

II - quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

III - quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;

IV - quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;

V - quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a autoriza;

VI - quando o processo for manifestamente nulo;

VII - quando extinta a punibilidade.”

Da inexistência de excludentes de responsabilidade

Nenhuma autoridade impetrada ou coatora se exime de responder a processo de habeas corpus.

Não se encontra na Constituição nem em lei alguma essa facultade a favorecer o autor da ameaça ou do ato suscetível de cabimento de qualquer habeas corpus, seja qual for a autoridade impetrada ou o cargo que possa ocupar na administração pública ou nas instâncias do Poder Judiciário.

Dos habeas corpus contra ministros do Supremo Tribunal Federal

A Constituição Federal não impede a impetração de habeas corpus contra qualquer ministro do Supremo Tribunal Federal, quando se apresente no polo passivo da impetração como autoridade impetrada ou como autoridade coatora.

Nenhuma súmula dessa Suprema Corte, por aceitável que possa ser, poderá ter seu alcance ampliado para vedar e, assim, não conhecer da impetração de habeas corpus contra quaisquer dos seus ministros.

Esse abuso interpretativo se constata não na Súmula  606/STF, que assim dispõe:

“Não cabe habeas corpus originário para o Tribunal Pleno de decisão de Turma, ou do Plenário, proferida em habeas corpus ou no respectivo recurso.

O abuso se verifica aí na sua elastecida aplicação, por analogia, ao instituir verdadeira e abusiva excludente de responsabilidade a favor de cada ministro, individualmente considerado. Tornando-o inimputável. Ou mesmo um inaceitável cidadão de primeira classe, numa sociedade onde, por comando constitucional,todos são iguais perante a lei. 

Em suma, cabe habeas corpus contra ministro do Supremo Tribunal Federal, na falta de expressa disposição em contrário na vigente constituição Federal, sob pena de responsabilidade por abuso de autoridade.

Do abuso de autoridade

 O crime do abuso de autoridade é normatizado na Lei 13.869, de 5 de setembro de 2019. 

E essa Lei se aplica inclusive a membros do Poder Judiciário (art. 2º, inciso IV).

Pode-se afirmar haver abuso de autoridade da parte de qualquer ministro do Supremo Tribunal Federal que, como relator do habeas corpus, invocando a Súmula 606/STF, impeça o andamento e, asssim, o julgamento de mérito no caso de habeas corpus impetrado em desfavor de qualquer outro integrante da Corte.

Repita-se, o direito à impetração de habeas corpus é ilimitado, não se sujeitando a qualquer subordinação a decisões jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, quando o impetrado seja autoridade coatora.

Conclusão 

Nenhum dos ministros do Supremo Tribunal Federal tem o benefício de imunidade de jurisdição.