terça-feira, outubro 06, 2015
Estabelece a Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça: “A pretensão de simples reexame de prova não seja recurso especial.”
Entendo que esse enunciado merece alguns reparos.
A Constituição Federal assegura a todos o direito à jurisdição.Quem recorre à Justiça o faz porque está proibido pelo ordenamento jurídico de fazer justiça pelas próprias mãos ou por encomenda a terceiros.
A administração da Justiça se insere entre os deveres inerentes ao Estado Democrático de Direito e entre os direitos do povo. A ordem social só se faz com Justiça.
Sob nossa Carta Magna, todo poder emana do povo e em seu nome deverá ser exercido.
Portanto, quem recorre ao Poder Judiciário mais do que exerce um direito constitucionalmente garantido de petição.
O direito de petição não se exaure no simples protocolo de um requerimento ao Poder Judiciário. Quem ao Judiciário comparece, o faz para ter uma resposta que possa aclarar dúvidas ou oferecer solução que possa dirimir litígios.
A solução dos litígios deve ser o objeto da prestação jurisdicional.
Toda ação judicial pressupõe a exposição dos fatos, dos fundamentos do pedido e do pedido. E, desse modo, nenhuma ação judicial será igual à outra, quando não houver coincidência desses três elementos.
Evidentemente, poderá haver diversas ações com esses mesmos requisitos, propostas por autores distintos. Não haverá aí, evidentemente, o fenômeno da litispendência. Que só ocorre quando as partes litigantes sejam, entre si, a mesmas, com coincidência desses três elementos: fato, fundamento e pedido.
A Súmula 7 do STJ, determinando que a pretensão de simples reexame de prova não seja recurso especial, deve ser vista “cum grano salis”, porque o reexame de prova não pode ser confundido com o reexame da causa de pedir, dos fundamentos do pedido e do pedido.
Deixar de analisar esses três elementos é negar jurisdição. É adotar uma atitude escapista, a indicar que o julgador estará se esquivando de julgar.
O ministro do Superior Tribunal de Justiça que examina os autos do processo, instado a tanto por um recurso especial, não “reexamina prova”. Saber se há nos autos determinada prova ou se essa prova ali não existe, não é “reexaminar prova”. Assim, se a prova ali existe, não se pode tê-la por inexistente. É mera constatação de um fato.
Todavia, é do fato que nasce o direito.
Se o fato provado deve conduzir a um julgamento de procedência da ação, é de rigor que a ação seja julgada procedente. Se o for contra os fundamentos de fato por sentença ou acórdão que devesse acolher tais fundamentos, o erro não estará nos fundamentos de fato, mas na decisão do julgador que os julga contra o direito.
Assim, é necessário distinguir entre erro de fato e erro de direito. A decisão que ignora o fato merece reparo para que seja, assim, sanada. A parte interessada deve, a tempo, reclamar essa correção. Já, no erro de direito, o juiz ou o tribunal extrai do fato uma interpretação contrária ao direito.
Desse modo, o recurso especial que demonstra o erro de direito e reclama sua correção não pode ficar obstado pela invocação do enunciado da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.
Reexame de prova não se confunde com a valoração jurídica da prova. Esta cabe no âmbito e no escopo do recurso especial. Aquele, não.
Ademais, súmula alguma se sobrepõe às garantias constitucionais expressas ou implícitas que nos assegura a Constituição Federal de 1988.
O direito de petição não se exaure no ato de apresentá-la no protocolo judiciário. Quem peticiona, quer uma resposta. E, no campo judicial, essa resposta deve ter por único objetivo a prestação jurisdicional, isto é, uma decisão de mérito que solucione a contenda entre os litigantes. É para isso que se abdica da justiça privada. Recorrer-se ao Poder Judiciário, a quem compete dirimir os litígios.
Não queremos uma justiça formal. Que encerra o processo sem julgamento de mérito. Havendo motivos para o acertamento do litígio, enquanto persista este, a solução por sentença ou decisão de mérito é um imperativo constitucional.
Nesse sentido, basta ler o que reza o artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal.
Voltando à Súmula 7 do STJ, e com apoio nesse inciso XXXV do artigo 5º da Constituição, verificamos a frequência com que o Superior Tribunal de Justiça aplica decisões equivocadas, deixando de dar seguimento a inúmeros recursos especiais e de proceder ao seu julgamento.
Assim, o excesso de formalismo a impedir decisões de mérito é manifesta ofensa à garantia constitucional à prestação jurisdicional. Prestar jurisdição é dizer o direito. É decidir se a parte tem ou não tem o direito que considera ter.
Como o direito à jurisdição constitui um direito público subjetivo, isto é, um direito de todos e de qualquer um na busca de justiça, deve a parte interessada arguir a violação do artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal sempre que o Superior Tribunal de Justiça vier a invocar a Súmula 7 diante de erro de direito (dado que valoração jurídica da prova não é nem se confunde com reexame de prova) para não julgar um recurso especial.
O direito material não pode sucumbir ao formalismo judicial. O processo é mero meio que deve conduzir à administração da Justiça. Jamais ser um obstáculo à consecução desse fim e objetivo.
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