quarta-feira, dezembro 14, 2016

Divórcio e separação de cotas de sociedade




É sabido o divórcio pode ocorrer sem simultânea partilha de bens do casal, quando adquiridos na constância do casamento e sob os regimes de comunhão parcial ou universal de bens.
 Em caso recente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu por unanimidade de votos que, na hipótese de separação do casal, as cotas de sociedade constituída durante o casamento e da qual apenas um dos ex-cônjuges seja sócio devem ser divididas pelo valor atual e não pelo valor histórico da data da ruptura do relacionamento.
O recorrente, médico do Paraná, entendia que o valor das cotas de sua propriedade em um hospital criado durante o casamento deveria ser aquele apurado à época da separação (em 2007), pois a separação judicial extinguiria o regime de bens e a valorização das cotas teria sido fruto de seu trabalho. A ex-mulher pleiteava o valor atual (2015).
É certo que divórcio não obriga o casal a promover a simultânea divisão do patrimônio comum a ambos, quando casados sob comunhão universal ou comunhão parcial de bens, pois no regime de separação total de bens, cada cônjuge já conserva a titularidade individual sobre o que a cada um pertença.
Vejamos essa decisão judicial e, ao fim, os comentários deste articulista.
No caso em questão, a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que quando o casamento é desfeito sem a partilha do patrimônio comum, mas apenas com acordo prévio sobre ela,  ocorre a comunhão patrimonial (mancomunhão).
“Nessas circunstâncias, não se fala em metades ideais, pois o que se constata é a existência de verdadeira unidade patrimonial, fechada, e que dá acesso a ambos os ex-cônjuges à totalidade dos bens”, explicou a relatora.
 Nancy Andrighi ressaltou tratar-se de uma realidade temporária, destinada a resolver um problema imediato – permitir o divórcio e seus desdobramentos legais –, que acaba se postergando e atrelando os ex-cônjuges ao patrimônio comum.
 No caso em análise, durante anos – contados da decisão que determinou a avaliação das cotas –, a ex-mulher, embora dona de metade delas, teve o patrimônio imobilizado e utilizado pelo ex-cônjuge “para alavancar, em retroalimentação, o crescimento da sociedade da qual ostenta a condição de sócio”.
Nesse período, segundo a relatora, a ex-mulher esteve atrelada, “por força da copropriedade que exercia sobre as cotas com seu ex-cônjuge”, à sociedade. “Então, ao revés do que pretende, não pode o recorrente (médico) apartar a sua ex-cônjuge do sucesso da sociedade” – considerou a ministra, afastando a tese de que coube apenas ao médico o sucesso da administração do negócio.
A ministra ressaltou que o acordo firmado entre o casal, em 2007, reconhecia apenas o patrimônio a ser partilhado, no qual se incluíam as cotas. Passados mais de oito anos, acrescentou Nancy Andrighi, “só atenderá a uma partilha justa e equilibrada” se o valor das cotas refletir o patrimônio atual da sociedade.
Outra fórmula de divisão, segundo ela, significaria “enriquecimento sem causa” do médico, “com o que não se coaduna o direito”. O voto da relatora foi acompanhado pelos demais ministros da Terceira Turma.
Comentários deste articulista
No divórcio, o acordo do casal quanto à divisão dos bens comuns é de extrema relevância, pois será ai e então possível definir que bens caberão a cada um deles na partilha do patrimônio.
Nota-se, em primeiro lugar, que a ex-mulher não fazia parte do quadro societário desse hospital. Não era sócia, detentora de cotas sociais. Entretanto, no acordo firmado entre o casal, em 2007, reconhecia-se apenas o patrimônio a ser partilhado, no qual se incluíam as cotas. Essas cotas deveriam ter ficado excluídas da divisão, por cláusula expressa no acordo de divórcio.
Cuidando-se de sociedade constituída pelo médico com outras pessoas, e estando casado sob o regime de comunhão parcial de bens (ou universal), o valor das cotas do médico foi, assim, considerado para efeito de partilha entre ele e a ex-mulher.
Nesse sentido, essa decisão judicial está correta, pois a divisão patrimonial do casal ficou a depender de formalização da partilha em data futura, posterior ao divórcio. Exatamente por isso, é irrelevante a referência a possível enriquecimento sem causa do médico, principalmente se o valor atual das cotas, apurado em balanço especial para fins dessa partilha, apresentasse prejuízo na comparação com seu valor em 2007 (ano do divórcio).
Em síntese, é necessário muito cuidado na elaboração do acordo de divórcio quanto à partilha de bens do casal.